Noziel Antônio Pedroso, o cronista de um povo


O Vale do Ribeira tem muitas histórias. Diversos escritores regionais já publicaram livros sobre a história, os casos e os “causos” desenrolados por aqui, em diferentes épocas. Para que seja valorizada a história de nosso País é, antes de tudo, necessário que conheçamos e valorizemos a história de nossas cidades.

Noziel Antônio Pedroso, o cronista de um povo
Noziel Antônio Pedroso, o cronista de um povo


Registro-SP, apesar de relativamente nova, tem muita história; e muitos “causos” também. Já conhecia um pouco de sua história oficial, através das páginas dos antigos jornais editados em Iguape. Possuo, inclusive, alguns números do primeiro jornal registrense, chamado, bem propriamente, de O Registro, que veio à luz no ano de 1925. Não conhecia, ainda, os interessantes “causos” e histórias orais, transmitidas de geração a geração.

Noziel Antônio Pedroso, o cronista de um povo
Livro “Registro, histórias, boatos, causos, mitos e lendas de um povo”

Reli, de uma tacada só, o delicioso livro “Registro, histórias, boatos, causos, mitos e lendas de um povo”, do amigo Noziel Antônio Pedroso, conhecido escritor, músico, compositor, cronista e agitador cultural, uma das mentes mais brilhantes de nossa região. O livro é saboroso. Cada página é um convite ao humor e, em alguns capítulos, ao enternecimento.

Escrevendo numa linguagem direta, como se estivesse conversando cara a cara com o leitor, o estilo de Noziel lembra muito Jorge Amado ou João Ubaldo Ribeiro. Até mesmo os palavrões, na pena de Noziel, adquirem uma inocência franciscana, pois sempre são recheados de muito humor e espontaneidade. E não estou falando de histórias inventadas, não. São histórias reais, vividas, carnais, sofridas.

Ficamos conhecendo até mesmo detalhes insuspeitos de ilustres personalidades. Como um respeitado ex-prefeito que, na juventude, foi “ladrão de galinhas” (sendo desculpado devido aos arroubos da juventude). Ou o dono de uma auto-escola que tinha uma maneira peculiar de conversar com seus empregados, usando palavras que fariam corar até mesmo Dercy Gonçalves.

No livro encontramos gente de todos os tipos e gostos. Tem lá Lourenço Marques, o maior mentiroso de Registro. Tem a Rita Pidonha. O Mario Gonzaga, conhecido como o “Tio Patinhas” registrense. Temos as desavenças políticas entre os ex-prefeitos Jonas Banks Leite e José de Carvalho, com a história da “Cobra Grande”. Ou o interessante jogo de palavras que conta a vida dos irmãos gêmeos João Oscar Pio e João Oscar Calá, entre outras fascinantes histórias.

Não dá para ficar insensível à comovente história de “Quebradinho”, que comeu o pão que o diabo amassou, mas que conservava sempre o bom humor. Como certa vez quando um casal de namorados estava em conversações (digamos, íntimas), no escurinho, e apareceu o “Quebradinho” e contou-lhes sobre as suas necessidades fisiológicas, com a maior naturalidade do mundo.

Com seu estilo claro, direto, Noziel pode ser colocado na galeria dos bons cronistas brasileiros. E pelo seu bom humor pouco fica a dever a um Luiz Fernando Veríssimo, que recria, em suas crônicas, a comédia da vida privada brasileira. A diferença é que Noziel não inventou nada. Ao contrário, foi buscar na realidade de sua cidade as histórias tragicômicas, que recheiam as páginas do livro.

Já em sua terceira edição, a obra nos propicia conhecer melhor Registro, a Capital do Vale. Afinal, nem só de história oficial vive um povo. A história não é feita apenas por decretos, leis, atas ou documentos oficiais. A história é feita, principalmente, por pessoas de carne e osso, que amam, que traem, que xingam, que ajudam, que vivem a vida à sua maneira, sem a preocupação de registrá-las em documentos.

Aos cronistas cabe reconstituir o dia a dia, a vida familiar e social, as amizades, os escorregões e mancadas, enfim, aquilo que a vida tem de mais saboroso. Quem ainda não leu Noziel, não sabe o que está perdendo.

(Crônica publicada no Jornal Regional [de Registro], nº 1.189, de 29 de abril de 2016)

ROBERTO FORTES
ROBERTO FORTES, historiador e jornalista, é licenciado em Letras e sócio do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo.  E-mail: robertofortes@uol.com.br




(Direitos Reservados. O Autor autoriza a transcrição total ou parcial deste texto com a devida citação dos créditos).

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