Muito antes mesmo de serem descobertas as primeiras minas auríferas nas Gerais, já o Vale do Ribeira conhecera o fastígio do ouro. Foi um período de riquezas que se verificou em Iguape, Cananeia, Xiririca (Eldorado), Apiaí e Iporanga. Em Iguape, inclusive, foi estabelecida uma casa de fundição, considerada a primeira do país, na qual era transformado em barras todo o ouro encontrado na região.
As origens históricas da atual
cidade de Registro (SP) remontam ao tempo da mineração do ouro, nos idos do século
XVII, quando no local foi estabelecido pela Coroa portuguesa um oficial para
registrar o ouro minerado nos rios da região do Vale do Ribeira, que deveria
ser quintado (ou seja, pago o devido quinto real, equivalente a vinte por cento)
na Casa de Fundição de Ouro da Vila de Iguape.
Registro não conheceu o esplendor do ciclo do ouro, mesmo porque
ainda não existia como povoado naquela época. O que havia era um ponto de referência,
um prédio do Fisco ou algo assim, talvez com algumas choupanas em volta, para
registrar o ouro que passava pelo rio Ribeira.
A esse respeito é bastante esclarecedor o que escreveu o
historiador iguapense Waldemiro Fortes, em sua crônica “Colônia de Registro”, publicada no jornal “O Registro”, nº 13, de 6-12-1925:
“A denominação do
nome de Registro, onde está situada a florescente colônia, foi dada em época
remota, porque era antigamente o lugar onde era cobrado o dízimo do ouro que
descia pelo Ribeira, e registrado o peso do precioso metal a ser transformado
em barras na casa da fundição de ouro de Iguape”.
Por sua vez, o historiador Ernesto Guilherme Young, em seu
trabalho “Subsídios para a história de
Iguape - Mineração de Ouro” (Revista do Instituto Histórico e Geográfico de
São Paulo, Volume VI, 1902), referindo-se à sonegação e extravio do ouro,
escreveu:
“Houve uma época em
que o extravio conhecido era tão grande que o Governo, para evitá-lo, mandou
edificar uma casa na margem do rio Ribeira, em logar onde os mineiros, descendo
em canoas, eram obrigados a passar, sendo ahi estabelecido um guarda fiscal
para registrar os mineiros e registrar a quantidade de ouro que traziam para a
villa [Iguape]. O logar onde foi estabelecido essa guarda é
conhecido até hoje pelo nome de ´Registro´”.
Em seu livro “A Vila de Prainha” (2ª edição ampliada, Edição do Autor, 1984), o
historiador Paulo de Castro Laragnoit escreveu:
“Os agentes fiscais da Coroa Portuguesa não dormiam. No alto de um
morro, com ampla visão do rio, foi instalada a Casa do Fisco, passando essa colina
a ser conhecida como ´Morro da Espia´.”
Edmundo Krug, em “A Ribeira
de Iguape” (separata do Boletim da Agricultura, Série 39, Secretaria da
Agricultura, Indústria e Commercio do Estado de São Paulo, 1939), descrevendo o
progresso que notou no distrito de Registro, alinhavou o seguinte comentário:
“O seu nome provém dos tempos do ouro na zona;
era ahi que os portadores do metal invejado tinham de passar para registrar a
quantidade de ouro que traziam das minas, rio acima, afim de pagarem, ahi mesmo,
ou em outra localidade, o Quinto Real, isto é, o pesadíssimo imposto de 20%
sobre a mercadoria bateada, destinado do governo portuguez.” (pág. 41)
Pasquale Petrone, em “A
Baixada do Ribeira” (Boletim nº 283, Geografia nº 14, Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, São Paulo, 1966),
escreveu:
“Além disso, também
ligado ao ouro, criava-se, junto ao Ribeira, a jusante da confluência com o
Juquiá, o porto de Registro, que conforme o próprio nome indica, era local
destinado ao controle da produção de rio acima, para efeito do pagamento dos
quintos reais.”
Mas onde ficava esse posto do Fisco? Selmo Mimo de Oliveira, em “Os Bastidores do Poder” (Gráfica
Stampato, 2002), lança algum luz a esse respeito:
“A Casa de Registro,
onde a cobrança era efetuada, ficava na margem direita do rio Ribeira de
Iguape, local por onde as canoas passavam cheias de minérios que vinham dos
afluentes e dos rios Juquiá, Eldorado e Sete Barras.”
O escritor Noziel Antônio Pedroso, em “Histórias, Boatos, Causos, Mitos e Lendas de um Povo” (Edição do
Autor, 3ª edição, 1997), com o bom humor que lhe é peculiar, amplia mais o
nosso conhecimento sobre o local onde foi instalado o Fisco:
“[...] as autoridades
decidiram instalar à margem direita do rio Ribeira de Iguape um local
apropriado, um posto de registro do precioso metal e a famosa Casa do Fisco.
Inicialmente o local ficou conhecido como ´Posto do Registro´, passando a
denominar-se simplesmente Registro. Os fiscais da Coroa Portuguesa não dormiam
no ponto, não. Para evitar falcatruas, eles ficavam de olho em quem passava
pelo Porto. No alto de um morro das proximidades, eles implantaram a ´Casa do
Fisco´. Nesse local estratégico eles tinham visão total do Porto e qualquer
passo em falso era acompanhado lá do alto. Ai daquele que pisasse na bola e
tentasse passar sem pagar. A embarcação era abalroada no ato e o caloteiro
ainda ouvia umas poucas e boas. Esse lugar (final da rua Dom Pedro II, de onde
pode-se chegar à rua Miguel Aby-Azar através de uma imensa escadaria) ficou
conhecido como ´Morro do Espia´”.
É lícito acreditar que existissem alguns sitiantes espalhados
pelas margens do rio Ribeira, mas certamente ainda não havia um núcleo
populacional organizado. É novamente Edmundo Krug, na referida obra, que nos
conta como era o povoado de Registro em 1902, quando foi visitado por esse
cientista:
“Recordo-me de que,
ainda no anno de 1902, quando visitei, pela primeira vez, as diversas
localidades da Ribeira de Iguape, Registro nada mais era que um mísero conjunto
de três a quatro casas de pau-a-pique. Hoje [1939] é uma localidade
cheia de prédios, com bom porto fluvial, bons hotéis, casas sólidas de
alvenaria e toda a população com magnífica disposição ao trabalho. A maior
parte de seus habitantes é de origem japoneza.” (pág. 42)
A FREGUESIA DE
REGISTRO
Um manuscrito existente na
Biblioteca Nacional (disponibilizado digitalmente na Homeroteca Digital sob
número 1461066), comprova que a localidade de Registro foi elevada à categoria
de “Freguesia”, vinculada à Vila de Iguape, em 1768. Freguesia é uma jurisdição
eclesiástica, modernamente equivalente a paróquia.
Em carta enviada da “Villa de Iguape” em 7 de agosto de 1768,
o coronel Afonso Botelho de Sampaio e Souza – encarregado pelo governador da
Capitania de São Paulo, Luiz Antônio de Sousa Botelho Mourão (o Morgado de
Mateus), para criar novas povoações no sul de São Paulo –, comunicava a chegada
à Vila de Iguape do padre João da Silva, que fora nomeado como pároco da nova “Freguesia do Registro”. O padre trouxe,
além da provisão de pároco, também provisões para fundar a igreja e para
levantar logo o altar “em que possa
celebrar os ofícios divinos no mesmo lugar que há de ser a Igreja”.
Na carta, Afonso Botelho,
cientifica o governador que os moradores do local, “como já participei a Vossa Excelência”, pedem que a Fazenda Real
forneça “ferramentas e ferragens necessárias
e os paramentos para logo poderem assistir os Divinos Cultos”. A construção
da pequena igreja e o estabelecimento da Freguesia de Registro devem ter
ocorrido nesse mesmo ano de 1768.
A mineração do ouro, ainda que em
pequena escala, continuou por todo o século XVIII até o início do século XIX.
Em 1807, os moradores da Freguesia de Xiririca se queixaram à Câmara da Vila de
Iguape sobre o imposto pago no Fisco de Registro. A esse respeito, o
historiador Waldemiro Fortes escreveu a seguinte nota (“Xiririca”, in “O Iguape”,
nº 87, de 22-8-1926):
“26 de setembro de 1807: A
Câmara de Iguape atestou uma representação dos moradores de Xiririca sobre o
pagamento de ônus no Registro do Ribeira.”
Essa informação é valiosa por dois motivos: comprova que no início do
século XIX ainda se praticava a mineração do ouro na região e também que ainda
existia o Fisco na localidade de Registro.
Depois do ciclo do ouro, o
povoado de Registro não apresentou crescimento apreciável, ficando restrito à
sede e a diversos sítios situados ao longo do rio Ribeira e outros rios.
Somente a partir da segunda
década do século XX, com o estabelecimento de uma colônia japonesa, em 1914, é
que Registro conheceu um surto de progresso, com a criação do distrito policial
em 1928, do distrito de paz em 1934 e com a elevação a município em 1944,
transformando-se, a partir de então, na “Capital do Vale do Ribeira”.
A COLÔNIA JAPONESA
Foi no dia 8 de março de 1912 que o Governo do Estado de São Paulo
assinou um convênio com o Sindicato de Tóquio para o estabelecimento de
colônias japonesas no Vale do Ribeira. A primeira a ser instalada foi a
Katsura, no bairro do Jipovura, em Iguape, no dia 9 de novembro de 1913. Em
seguida, seriam instaladas as colônias de Registro e Sete Barras.
Em 1913, essa concessão passou para a Empresa Brasil Takushoku Kaisha.
A colonização de Registro deu-se a partir de 1914, quando, no dia
2 de setembro daquele ano, os primeiros colonos receberam provisoriamente os
seus lotes. Como sucessora dessa companhia, surgiu a KKKK (Kagai Kogyo
Kabushiki Kaisha), que passou a operar por decreto,
em 1918.
Seu primeiro diretor foi o senhor Katsumi Fujita, que a dirigiu
por muitos anos.
Em 17 de setembro de 1923, faleceu o Dr. Kenzo Kitajima, que era o
diretor clínico da colônia. A sua morte causou profunda comoção em Registro e
também em Iguape, onde gozava de bons relacionamentos e possuía muitos amigos.
No dia 5 de junho de 1926, faleceu o senhor Keisi Sasara, aos 35
anos, gerente da KKKK. Gozava grande estima e tinha muitos amigos na colônia.
Em 1926, existiam em Registro nada menos que 320 famílias de
lavradores japoneses.
Depois a direção da Colônia ficou a cargo do Dr. Guyoske
Shiratori. Já em 4 de dezembro de 1928, o diretor Shiratori, removido para a
Capital do Estado, foi substituído pelo senhor Sansuke Sakara.
Em 1931, a população de Registro era de 8 mil habitantes, sendo
3.641 de origem japonesa. Em novembro daquele ano, a Colônia foi visitada por
Fernando Callage, que era o chefe da Seção de Publicidade e Estatística da
Secretaria da Agricultura, Indústria e Comercio. Callage visitou as colônias japonesas
de Registro, Sete Barras e Jipovura. Dessa visita resultou o trabalho “As Colônias Japonesas de São Paulo”,
observações pessoais publicadas em 1933 no número 75/76 do “Boletim do
Departamento do Trabalho Agrícola”.
Primeiramente, Callage visitou a fazenda do senhor Torazo Okamoto,
onde existiam mais de 8 mil pés de chá da índia que já eram colhidos e ainda
mais de 20 mil pés plantados. A sua produção era de 2.500 quilos por mês.
Okamoto chegou em Registro por volta de 1918, tendo desembarcado em São Paulo
com apenas 20 mil réis no bolso. O chá preto, do tipo Assam, foi introduzido na Colônia por Okamoto, que trouxe a sementes,
segundo contam, dentro de um filão de pão trazido do Ceilão (hoje Sri Lanka).
Na área do ensino, a Colônia possuía duas escolas reunidas, seis
escolas rurais e cinco particulares. No Carapiranga, existia uma Escola
Reunida, a primeira criada, dirigida pela professora Aurora Coelho. Essa escola
foi doada ao Governo do Estado pela colônia japonesa. O prédio era confortável,
possuindo três amplas salas e uma grande área coberta para o ensino de
português, e a outra, maior, para o ensino do idioma japonês.
Em 1931, estavam matriculados mais de 137 alunos, sendo que apenas
20 eram filhos de brasileiros. Os japoneses demonstravam grande aplicação nos
estudos, principalmente em aprender o português e tinham maior propensão à
aritmética e à leitura. Eram inteligentes e aprendiam com facilidade. Porém,
eram renitentes quanto ao estudo de História do Brasil e Geografia. A
professora era Ema Barreto, sendo os alunos irrepreensíveis.
As casas dos colonos eram de madeira e primavam pela ordem,
limpeza, higiene e relativo conforto. Em toda casa existiam sempre jornais,
revistas e livros. Liam de tudo, desde publicações sobre agricultura até
revistas de informações gerais. Curiosamente, nas casas não se viam quaisquer
publicações brasileiras.
A lavoura era bem diversificada; plantavam de tudo: arroz, batata,
milho, café, feijão, outros cereais e hortaliças. Os colonos japoneses eram
bastante trabalhadores, mas se utilizavam dos caboclos para a derrubada das
matas e nos vários serviços da lavoura. Outra fonte de riqueza da Colônia era o
fio-de-seda, existindo plantações de amoreiras para a criação do bicho-da-seda.
Nas margens do rio Ribeira, existiam campos de experiência para o ensino de
técnicas agrícolas aos colonos.
Havia o casamento de japoneses com brasileiras. Curiosamente, não
se verificavam o de japonesas com brasileiros.
Na área de lazer, possuíam campos para tênis e outros esportes.
Existiam um time infantil e uma associação de escoteiros de ambos os sexos.
Em 1937, seria rescindido o contrato entre a KKKK e o Governo do
Estado, o que, certamente, deve ter afetado a companhia. Assim, ano de 1955, o
prédio da KKKK foi penhorado, ocasião em que essa empresa entrou em liquidação.
O
PRIMEIRO JORNAL
O primeiro jornal da Colônia foi fundado no dia 7 de setembro de 1925 e se chamava “O Registro”. Seu diretor-proprietario era Luiz Go Hioki, sendo redator-secretário Takehiro Midorikawa. Era “impresso a mimiotype” e se intitulava “o orgam da mocidade ribeirense”.
A sua assinatura anual custava dez mil réis, a semestral, seis mil
réis e o número avulso era vendido a 300 réis. Funcionou regularmente por
alguns anos e, pela leitura de suas edições, é possível saber como era o dia a
dia na colônia naqueles saudosos anos 1920.
A Colônia também foi berço do jornalista Sacr Miura, que escrevia
no “The Osaka Asahi”, do Japão, e era
ainda diretor do “NipparuShimbum”, de
São Paulo. Miura formou-se em Direito em Tóquio.
OS
COMERCIANTES PIONEIROS
O antigo comércio da Colônia, principalmente nos anos 1920, era
bem variado, e muitos comerciantes possuíam firmas estabelecidas no lugar. Em
maio de 1926, o senhor Sacr Namur, conceituado comerciante em São Paulo, abriu
na Colônia uma casa comercial onde vendia fazendas, artigos da moda e
armarinhos, no mesmo ramo em que estava estabelecido na capital. Namur sempre
ficava por algum tempo em Registro, onde possuía uma casa, tendo estabelecido
contato com a Colônia por volta de 1920, granjeando a simpatia dos japoneses e
também da região.
Folheando algumas edições do jornal “O Registro”, de 1925, é possível termos uma ideia de como era esse
comércio naquela época. Existia o Armazém
Toyota, que pertencia a Koshiro Toyota. Miguel Aby-Azar e seu irmão Felix
Aby-Azar comercializavam arroz, num armazém perto de um antigo porto. A Casa Ideriba & Ono era um armazém
onde se vendiam secos e molhados, fazendas, armarinhos e bebidas finas. A Casa Sassaki ficava em frente ao Porto
de Registro e vendia artigos de primeira necessidade e bebidas finas. Havia a Alfaiataria Hiraguti, onde o seu
proprietário garantia que os trabalhos eram feitos “com a máxima presteza”. Kotaro Sakano era o proprietário da Selaria e Sapataria Central,
especializadas em sapatões e selas.
Existia também o Hotel
Registro, que pertencia a Shitiro Maeji, que possuía quartos arejados,
cozinha brasileira e japonesa e servia vinhos finos nacionais e estrangeiros.
Shijiro Aoki era o dono da Casa Aoki,
que vendia secos e molhados, fazendas, armarinhos e bebidas. A firma H. Kurita & Irmão possuía uma “machina” de beneficiar café e
torrefação; ficava na antiga rua Direita, nº 18, e cobrava cerca de 6 mil réis
por cada saco de 60 quilos de café beneficiado. Na loja de Washizo Sugayama se
encontravam fazendas, secos e molhados, bebidas finas, louças e ferragens e
artigos escolares; era ainda atacadista de aguardente e representante exclusivo
da querosene “Jacaré”.
Uiti Kiniyuki possuía uma fabrica e depósito de aguardente e
caninhas velhas. Iwao Yassuda vendia secos e molhados, bebidas finas nacionais
e estrangeiras, além de conservas especiais, ficando a sua loja em frente ao
Porto de Registro. Joaquim Marques Alves possuía um armazém no porto onde
vendia de tudo. No depósito da KKKK, existia grande deposito de arroz, açúcar e
aguardente, sendo chefe do armazém Kenji Sasahara. Existia também a Associação
Comercial de Registro, cujo presidente era Tomeshiro Baba, que também possuía
depósito de arroz, açúcar e aguardente e era despachante do porto.
Nos bairros rurais, a exemplo da sede da Colônia, o comércio
também era importante. No porto de Carapiranga, ficava a fábrica e depósito de
aguardente de Katsumi Fujita. Na Barra do Taquaruçu ficava o armazém Nakashima,
que vendia secos e molhados e fazendas. No Bamburral, havia o Armazém Matuzawa e vendia secos e
molhados, fazendas e armarinhos e possuía também uma fábrica de aguardente. No
Quilombo, Raphael Moreira vendia secos e molhados, fazendas e armarinhos, além
de comprar criações de animais. No Capinzal, Simião Francisco era um grande
agricultor de café.
O INCÊNDIO QUE
MOBILIZOU A COLÔNIA
No ano de 1925, Registro ainda era um lugar bastante acanhado,
conforme podemos verificar pela matéria publicada pelo semanário Tribuna de Iguape, nº 515, de 20 de
setembro de 1925:
“Registro, como se
sabe, é um desses lugarejos, com duas dúzias de casas esparsas às margens do
tranqüilo Ribeira, que corre ahi plácido e sereno, qual manso lago, reflectindo
em suas argênteas águas do céo azul. Na sede há algumas casas melhores. Dentre
alguns negociantes lá residentes, há um que é brasileiro: o sr. Joaquim Marques
Alves, mas a colônia é ahi em sua totalidade japonesa”.
Em setembro de 1925, o armazém de Joaquim Marques Alves foi
completamente destruído por um incêndio, causando prejuízo calculado entre 30 a
40 contos de réis. Essa tragédia mobilizou toda a Colônia Japonesa, que deu uma
prova inegável de seu carinho e respeito pelo comerciante. Rapidamente,
conseguiram tirar Joaquim Marques Alves e toda a sua família de dentro da casa,
que estavam quase asfixiados pela fumaça.
Os japoneses dominaram o incêndio e atravessaram a madrugada na
tarefa de reconstruir o armazém do comerciante, cada um buscando em sua casa o
material necessário para essa tarefa. Só foram permitir que Joaquim Marques
Alves se aproximasse do local quando assoalhos, forros e prateleiras já estavam
reconstruídos. Fizeram ainda, uma subscrição entre si, conseguindo arrecadar
logo de inicio dez contos de reis, que entregaram ao comerciante para cobrir
parte dos prejuízos.
A AGÊNCIA DO CORREIO
Em março de 1926 era instalada na Colônia a primeira agência de
Correio, conseguida pelo vereador iguapense Dr. Silvino Martins junto ao
administrador dos Correios de Santos. O prédio para a instalação dessa agência
foi oferecido pela Colônia Japonesa.
Ficou sendo o primeiro agente postal Takahiso Midorikawa,
brasileiro filho de japoneses, que foi indicado pelo diretório do Partido
Republicano Paulista local. Midorikawa assumiu o cargo em 6 de março daquele
ano.
O CRIME QUE ABALOU
REGISTRO
Em 1926, a costumeira paz da colônia seria abalada em virtude do
assassinato do comerciante Miguel Aby-Azar, na noite de 7 de outubro daquele
ano. O crime foi praticado pelo próprio primo e cunhado da vitima, David
Aby-Azar, auxiliado pelos cúmplices Elias Felix Kalid e Antônio Amparo da Silva
(vulgo Antônio Magdalena).
Toda a região ficou consternada, pois Miguel Aby-Azar era uma
figura muito bem relacionada e respeitada. Veio de Santos especialmente para
solucionar o caso o comissário de policia Dr. Washington de Almeida, que foi
auxiliado pelo delegado de Iguape, Dr. Carlos de Sampaio Formosinho.
Após vários e sucessivos julgamentos, David Aby-Azar foi condenado
em 1929 a 16 anos e meio de reclusão, Elias Kalid a 8 anos e Antônio Magdalena
absolvido.
A IGREJA MATRIZ
A pedra fundamental dessa igreja foi lançada no dia 31 de agosto de 1926, por ocasião das festividades ao padroeiro São Francisco Xavier, com ato religioso celebrado pelo bispo de Santos, D. José Maria Pereira Lara, solenidade que foi abrilhantada pela banda musical de Sete Barras.
Em seguida, houve missa campal e, após, a comissão dos festejos
ofereceu ao bispo um almoço, do qual participaram figuras importantes da
localidade e da região.
À tarde, o Bispo embarcou num vapor juntamente com o padre
Paschoal Cassesse, de Iguape, e mais dois missionários, com destino a Xiririca
(Eldorado), para participar da festa da Nossa Senhora da Guia.
Depois de vários anos de dedicação da comunidade local –
destacando-se principalmente, o esforço da colônia japonesa – a Igreja Matriz
foi solenemente no dia 29 de abril de 1933, com a presença do mesmo bispo, D.
José Maria Pereira Lara.
Registro finalmente conseguia o seu templo católico.
A FESTA DO PADROEIRO
Sempre que o bispo de Santos comparecia a Registro para celebrar a
festa do padroeiro, os japoneses da Colônia cercavam-no de atenções,
demonstrando todo respeito pela religião católica. Curiosamente, quando o bispo
não participava da festa, os japoneses se ausentavam dos atos religiosos.
A novena começava no dia 24 de novembro e terminava em 3 de
dezembro, dia consagrado ao padroeiro. A primeira festa realmente organizada,
com programa e tudo, aconteceu no ano de 1928, e ficou aos cuidados do festeiro
Sacr Namur, comerciante da colônia, auxiliado por dona Isaura Lacerda.
A festa foi animada pela banda Santa
Cecília, de Iguape, dirigida pelo maestro Paulo Massa, e os ofícios
religiosos celebrados pelo padre Frederico Hellembrock, da Paróquia de Iguape.
Nesse ano, foram organizadas três procissões, sendo a do
padroeiro, na tarde do dia 3, a mais imponente, com seis andores ricamente
trabalhados.
À noite, houve queima de fogos de artifícios. Entoaram os cânticos
durante as novenas as senhoras iguapenses Francisca Massa, Mathilde Salgado,
Anita Massa, América Massa e também dona Josephina Namur.
Nessa ocasião, foi escolhido festeiro para o ano de 1929 Joaquim Marques
Alves e a sua esposa.
O DISTRITO POLICIAL
Em 1928, foi criado o Distrito Policial de Registro. No dia 13 de
abril daquele ano, foram empossados o subdelegado Gaspar Sant´Anna Ferreira e os
seus suplentes José de Oliveira, Joaquim Antônio de Campos e Antônio Victor
Ribeiro, perante o delegado de Iguape, capitão Antônio Fortes, nomeados por
decreto no dia 3 de abril.
Após a posse, o capitão Fortes procedeu à instalação da Subdelegacia
de Polícia, cujo ato foi assistido por pessoas importantes e autoridades de
Registro, sendo lavrada uma ata especial em livro próprio, aberto, rubricado e
encerrado pelo delegado de Iguape.
O prédio onde se instalou a Subdelegacia, a cadeia e o alojamento
para os soldados do destacamento foi cedido pela Colônia Japonesa, através do
seu diretor Guioske Shiratori.
REGISTRO CLUB
A Colônia possuía um refinado clube social, onde a comunidade
japonesa se reunia para seus momentos de lazer. Era o legendário Registro Club, que marcou época no
lugar.
Muitos bailes e festas eram realizados em seu recinto, como o
grandioso baile realizado no dia 28 de abril de 1928 em comemoração ao aniversario
do imperador Hiroito. Da comissão encarregada desse baile participaram o Dr.
Yampei Kikushi, médico da colônia, e o Dr. Sansuke Sakara, diretor da KKKK.
O baile, que se prolongou até a madrugada, foi animado pelo
pianista iguapense Paulo Massa e seu conjunto. Participaram da festa muitos
convidados da região.
Por falar em Yampei Kikushi, os seus amigos e admiradores lhe
ofereceram um concorrido baile no Registro
Club, no dia 8 de janeiro de 1930, em comemoração ao seu aniversário.
A COOPERATIVA
AGRÍCOLA
No dia 4 de agosto de 1928 foi fundada a Sociedade Cooperativa de
Responsabilidade Limitada dos Agricultores de Registro S.A, que tinha como
presidente o diretor da Colônia, Guioske Shiratori, e como vice-presidente
Shinkichi Suguinoshita. O capital foi constituído por 1.076 ações de cem mil réis
cada uma.
Essa cooperativa tinha como objetivo incrementar a agricultura na
colônia, além de vender por conta própria, comissão ou consignação, os produtos
dos sócios e de terceiros, e conceder adiantamento aos sócios para custeio de
suas lavouras. Era composta por 221 sócios, entre eles a KKKK.
VISITANTES ILUSTRES
No passado, a Colônia recebeu a visita de muitas personalidades
ilustres, que vieram conhecer de perto o progresso da comunidade.
Em 1916, o ministro plenipotenciário do Japão, Dr. Hata, visitou a
Colônia.
Em junho de 1919, foi a vez do também ministro plenipotenciário
Kouma Korigoutchi.
Em maio de 1929 a Colônia seria visitada pelo cônsul-geral do
Japão em São Paulo, Sichiro Nakashima.
A EMANCIPAÇÃO
Registro foi elevado à categoria de Distrito de Paz através do
Decreto-Lei nº 6.665, de 17 de setembro de 1934, ainda pertencente ao município
de Iguape, mas adquirindo relativa autonomia, sendo instalado um Cartório Civil,
que passou a realizar casamentos e batizados, até então feitos apenas em
Iguape.
A emancipação política veio dez anos depois, através do Decreto-Lei
n° 14.334, de 30 de novembro de 1944, sendo que o município seria instalado em
1° de janeiro de 1945.
O primeiro prefeito foi Mário de Campos Pacheco, alto funcionário
do Departamento das Municipalidades, nomeado pelo governador de São Paulo, que
administrou o município criado por sete meses.
Em seguida, também nomeados pelo Governo, exerceram o cargo de
prefeito: João Augusto Aby-Azar (6 meses), Josino Silveira (2 anos) e José Dias
de Araújo (7 meses).
A Câmara Municipal foi instalada em 1948.
Dez anos após, seria a vez da criação da Comarca, através da Lei
nº 2.456, de 30 de novembro de 1953, sendo instalada no dia 1º de janeiro de
1954.
OS PREFEITOS
De 1944 a
1947, foram nomeados os seguintes prefeitos:
Prefeitos nomeados:
Mário
Campos Pacheco
João
Augusto Aby-Azar
Josino Silveira
Benjamin
Giani
José dias
de Araújo
Prefeitos eleitos:
Sizenando
de Carvalho (1948-1951)
Jonas
Banks Leite (1952-1955)
Wild José
de Sousa (1956-1959)
Éiichi
Tachiro (1959, por três meses)
Jonas
Banks Leite (1960-1963)
José de Carvalho
(1964-1968)
Jonas
Banks Leite (1969-1972)
José
Mendes (1973-1976)
José de
Carvalho (1977-1982)
Elza de
Carvalho (1983-1988)
Waldir
Ferreira de Moraes (1989-1992)
José
Mendes (1993-1996)
Samuel
Moreira da Silva Júnior (1997-2000)
Samuel
Moreira da Silva Júnior (2001-2004)
Clóvis
Vieira Mendes (2005-2008)
Sandra
Kennedy Viana (2009-2012)
Gilson Wagner Fantim (2013-2016)
Gilson Wagner Fantim (2017 em diante)
AVISO AO LEITOR
Neste trabalho, procuramos traçar um
ligeiro painel da história de Registro, através de dados coletados nos antigos
jornais de Iguape e em outras fontes históricas. Não se trata, portanto, da
história completa do município, mas tão somente de apontamentos avulsos que, no
entanto, nos dão uma ideia da história desse município, cognominado de “A
Capital do Vale”.
ROBERTO FORTES, historiador e jornalista, é licenciado em Letras sócio do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo. E-mail: robertofortes@uol.com.br |
Blog: https://robertofortes.blogspot.com/