Nem só Iguape tem o seu Ídolo (estatueta antropomórfica encontrada pelo
naturalista Ricardo Krone, no início do século XX). A “Cidade Ilustre do
Brasil” também tem o seu Ídolo (de Carvalho), escritor e pesquisador, que acaba
de lançar o romance “Aconteceu em
Cananéia”. Com uma prosa vigorosa, Carvalho, como é mais conhecido na
cidade, se releva um escritor de muitos méritos. Consegue prender o leitor
desde a primeira até a última página.
Capa do livro “Aconteceu em Cananeia”. |
O Vale do Ribeira já foi tema de vários romances, em diferentes épocas.
O escritor santista Vicente Duarte dos Santos publicou “Enquanto sonham as águas” (1958), que tem sua temática centrada em
Iguape e fala também de Juquiá e outros municípios do Vale. Eduardo Rodrigues
escreveu “O passageiro do destino”
(1995), que tem como personagem principal não outro senão o Bacharel de Cananeia.
Por sua vez, o conhecido José Roberto Torero, também santista, em parceria com
Marcus Aurélio Pimenta, publicou “Terra
Papagalli” (1997), novamente tendo como protagonista o Bacharel de Cananeia.
Ou seja, por várias vezes, a nossa região foi enfocada pela pena de escritores “de
fora”. Agora, um escritor do Vale do Ribeira escreve um romance tendo como pano
de fundo a nossa região, especialmente a velha Cananeia, de tantas tradições.
O escritor Ídolo de Carvalho. |
A história se passa entre Cananeia, Pariquera-Açu, São Paulo, Salvador
e... Moscou! Tem uma mulher maquiavélica, Salete; um apaixonado casal de
caiçaras, Léo e Nice; um arremedo de “agente russo”, Anatole; dois empresários
não tão honestos, Cadu e Almeidinha; uma criança sequestrada, Lucas; uma
rebelião no presídio feminino de Pariquera-Açu; um médico que é feito refém no
Hospital Regional do Vale do Ribeira; um fatídico naufrágio de barco pesqueiro,
no qual morre toda a tripulação, menos Léo; uma empregada, e cúmplice, Bete,
que auxilia a patroa, Salete, no sequestro do inocente Lucas, e ainda tem a
maldade de escrever uma carta anônima caluniando a honesta Nice; e... ufa!... haja
fôlego para tanta ação e aventura!
Tudo começa quando a maquiavélica e dissimulada Salete sofre um
acidente, no qual a sua caríssima lancha bate numas pedras. É socorrida por
Léo, que por ali passava com o seu barco. Salva pelo bravo pescador, Salete
tenta se insinuar para ele; mas não contava com a lealdade do caiçara para com
a sua amada, Nice. Desprezada, Salete arquiteta um plano diabólico: o sequestro
de Lucas, filho de Léo e Nice. Como uma
mulher rejeitada é pior do que praga de sogra, a ardilosa loira (sim, ela é
loira – mas nada pessoal contra as loiras, muito pelo contrário!), com o
auxílio da não menos maquiavélica Bete, tramam o sequestro do menino, que é raptado
pelo “russo” Anatole. O casal Léo e Nice vive um autêntico calvário e, unidos
pelo imenso amor e pela esperança de reencontrar o filho sequestrado, comem o
pão que o diabo não apenas amassou, como ainda pisou em cima.
Para dar um colorido todo especial ao seu romance policial, Ídolo de
Carvalho ambienta a história em lugares reais de Cananeia, inclusive com
pessoas que realmente moram na cidade. Mesmo sendo uma história fictícia, vemos
os personagens almoçar ou jantar nos restaurantes Naguissa do Silêncio, Porto
Camarão, Ararapira, tomar uns drinques no Bar da Vila, fazer
compras no Supermercado da Ilha. Também saboreamos as deliciosas
expressões caiçaras, que pontificam por toda a extensão do romance. Detalhista,
Ídolo de Carvalho narra como é feita uma pescaria no Mar de Dentro, como se
desmalha um peixe, além de nos fornecer ricas informações sobre vinhos finos,
iguarias refinadas, e até detalhes sobre armas de fogo. No final do livro, o
autor incluiu um interessante glossário, onde as palavras “estranhas”
(principalmente as expressões tipicamente caiçaras) podem ser consultadas.
Bem, não vou bancar o estraga-prazer e contar o resto da história,
senão o meu amigo Ídolo de Carvalho ficará chateado comigo. O leitor terá de
adquirir o livro e saborear cada página desse romance que já ficou com gosto de
“quero mais”. Ídolo de Carvalho reside em Cananeia, onde divide o seu tempo
entre aproveitar as belezas sem fim da cidade e estudar a História local,
principalmente o misterioso Bacharel de Cananéia.
“Aconteceu em Cananéia”, para quem gosta de bom livro, é uma ótima
pedida.
(Crônica publicada no Jornal
Regional, de 20 de outubro de 2006).
NOTA
Ídolo de Carvalho é
também autor de “Cananeia, o primeiro
povoado do Brasil - A saga do Bacharel, a verdadeira história”, lançado em
2012.
ROBERTO FORTES, historiador e jornalista, é licenciado em Letras e sócio do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo. E-mail: robertofortes@uol.com.br
(Direitos Reservados. O Autor autoriza a transcrição total ou parcial deste texto com a devida citação dos créditos).