Tive
a grata satisfação de participar do 3º Festival Literário de Iguape, realizado
de 6 a 9 de maio de 2015, num bate-papo com o jornalista Eduardo Bueno sobre o
misterioso Bacharel de Cananeia. Seleto público prestigiou a conversa, que foi
mediada pelo escritor Reynaldo Damazio.
Cananeia (crédito: Márcio Masulino) |
Sobre
o Bacharel de Cananeia já se escreveram muitas bobagens. Inúmeras “histórias”
sobre ele, de tanto repetidas, acabaram se tornando “verdades”, e consideradas
como tais até por pesquisadores conceituados.
À
pergunta do mediador “quem foi o Bacharel de Cananeia”, respondi com um
convicto “não sei!”. Frisei que apenas podemos afirmar sobre o Bacharel duas
coisas: que foi bacharel e que viveu em Cananeia. O resto são suposições.
Teria
sido padre, judeu, físico, maçon, falastrão, herege e outras coisas mais? Sim,
tudo isso é possível, mas para afirmarmos isto ou aquilo precisaríamos de
documentos históricos que até hoje ainda não foram localizados.
O
Bacharel só aparece na história 27 anos após o descobrimento do Brasil. Durante
um quarto de século ficou completamente incógnito. Foi somente em 1527 que o
navegante Diogo Garcia de Moguer escreveu em sua memória de navegação que teria
feito transações comerciais com o Bacharel, comprando mantimentos, um bergantim
e nada menos do que 800 escravos indígenas.
Depois
só vamos encontrar uma citação sobre o Bacharel em 1531, quando a esquadra de
Martim Afonso de Souza aportou em Cananeia, e o Bacharel se apresentou com
Francisco de Chaves e mais cinco ou seis castelhanos.
Cinco
anos mais tarde, em 1536, a rainha da Espanha escreveu ao Bacharel pedindo o
seu auxílio a uma expedição que viria ao Brasil, a ser comandada por Gregório
Pesquera Rosa, expedição que nunca se realizou, mas cujo pedido real demonstra
a importância do Bacharel.
Um
documento espanhol anônimo de 1540 menciona que o Bacharel viveu em Cananeia e ali
deixou muitas plantações. Podemos supor que o Bacharel, nessa época, já estivesse
morto ou, talvez, teria se retirado para outro local, presumivelmente Iguape.
Finalmente,
uma carta de confirmação de sesmaria, passada em São Vicente no ano de 1542
deixa claro que o local conhecido como Porto das Naus fora dado alguns anos
antes a “um Mestre Cosme Bacharel”.
A
partir deste último documento, cessaram as citações documentais sobre esse
enigmático personagem da história brasileira.
ROBERTO FORTES, historiador e jornalista, é licenciado em Letras e sócio do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo. E-mail: robertofortes@uol.com.br