Engenheiro, historiador, jornalista e político, Ernesto
Guilherme Young nasceu em Londres no dia 10 de setembro de 1850. Era filho de
Carlos Henrique Young (natural de Kidderminster, falecido em Iguape, aos 81
anos, em 12 de janeiro de 1892), sendo irmão de Henry George, Edward e Alfred.
Major Ernesto Guilherme Young, com a farda da Guarda Nacional, no início do século XX.
Após se formar em engenharia, foi recebido como membro
do conceituado Institut Civil Ingenners. Em 1871, com apenas 21 anos, embarcou
para o Brasil, atraído pelas grandes possibilidades de um país em pleno
desenvolvimento. Escolheu São Paulo para se estabelecer, tendo vindo em seguida
para Iguape, onde se fixou definitivamente. Em seguida, os seus irmãos também
imigraram ao Brasil.
Ernest William Young era o seu nome de batismo,
passando a assinar Ernesto Guilherme Young após adotar a nacionalidade
brasileira. Na época em que chegou ao Brasil, Iguape já era uma cidade cuja
decadência econômica se insinuava claramente, mas ainda possuía uma vida agitada,
um comércio relativamente abastado e um porto no qual inúmeros navios faziam
escala.
Foi representante na cidade de várias companhias de
navegação, como a Hammond e a Companhia de Navegação e Mineração Sul Paulista, que pertencia ao poeta e jurista santista Vicente de Carvalho,
grande amigo de Iguape.
A
FAMÍLIA
Ernesto Guilherne Young casou-se na Inglaterra com
Esther Baynes Young e, já no Brasil, foi patriarca de uma família numerosa, constituídas
por dez filhos: Alice Young Petters, casada com Augusto Petters (avós da
poetisa Adelaide Petters Lessa); Ernesto Carlos Young, casado com Sílvia
Rebello Young; Júlia Esther Young Gatto, casada com Antônio Ribeiro Gatto;
Eduardo João Alfredo Young, casado com Eufrosina Gatto Young; Isabel Adelaide Young
Teixeira, casada com Antônio Zacharias Teixeira; Fernando Guilherme Young,
casado com Maria Vieira Young; Sarah Young Moraes, casada com Salvador Vital de
Moraes; Horácio Baynes Young, casado com Maria Amaral Young; Bertha Young,
falecida criança; e Augusto
Young.
Ernesto Young, com a esposa Esther, na sala de estar de sua chácara, no início do século XX.
Durante toda a vida Ernesto Young residiu com a
família em sua bela chácara, que ficava na antiga rua Direita (hoje 9 de
Julho), em cujo prédio atualmente funciona a Casa da Sopa. A residência era decorada com pesados móveis vindos
da Inglaterra, como também as vestes e as louças. Sobre uma mesa de tripé,
Esther Young pousava a sua Bíblia inglesa para a leitura nos fins de tarde.
Alguns de seus descendentes ainda se encontram em
Iguape, enquanto outros se estabeleceram em São Paulo e até mesmo nos Estados
Unidos.
O
ENGENHEIRO
Em 1873, recentemente chegado ao Brasil, Ernesto Young
trabalhou como guarda-livros interino da colônia de Cananeia. Naquela
localidade, havia sido estabelecida pelo Governo da Província de São Paulo uma
colônia de imigrantes. Como engenheiro, Ernesto Young realizou importantes
trabalhos em diversas cidades do Estado de São Paulo como Descalvado, Campinas,
Atibaia, Pirassununga, Porto Ferreira, principalmente na construção de pontes e
outras obras de engenharia.
Em 1892, foi nomeado membro-correspondente da Comissão
Geográfica e Geológica de São Paulo e, naquele mesmo ano, instalou o primeiro
Posto Meteorológico de Iguape, sendo ele o primeiro a fazer observações sobre o
clima do município e região.
Em 1893, organizou o mais completo mapa do município
de Iguape e da região, baseado em trabalhos de cartógrafos anteriores e em suas
constantes viagens científicas pelo Vale do Ribeira.
Foi representante na cidade de várias companhias de
navegação, como a Hammond, de Walter J. Hammond, e a Companhia de Navegação e Mineração Sul
Paulista, que pertencia ao poeta
e jurista santista Vicente de Carvalho, grande amigo de Iguape. Sobre a
inauguração do vapor “Isabel” (depois
“Vicente de Carvalho”), em 5 de
fevereiro de 1893, noticiou a “Gazeta de
Notícias”, do Rio de Janeiro, em seu numero 36, de 6/2/1893:
“Iguape, 5 – Houve hoje
experiência official do vapor Isabel, da Companhia Sul Paulista, com numerosa
assistência. O vapor, de systema de roda à popa, feito em Inglaterra e armado
aqui pelo gerente Ernesto Young, desenvolveu a marcha de 12 kilometros por hora
contra a correnteza do rio Ribeira. Tem excellentes commodos para passageiros e
mercadorias, iguaes aos vapores de alto bordo. Exito brilhante, satisfazendo
plenamente a população d´esta cidade.”
Juntamente com o major Ricardo Krone, foi nomeado pela
Sociedade Científica de São Paulo, em sessão de 3 de fevereiro de 1904, para
estudarem os meios de proteção às grutas do Vale do Ribeira, que estavam
sendo bastante depredadas. Valiosos foram para Krone, em seus estudos das
cavernas, os conhecimentos técnicos do engenheiro Young, que desenhou muitos
croquis da região.
Em 1904, Ernesto Young, juntamente com o tenente
Eduardo Augusto Browne, apresentou ao Congresso do Estado de São Paulo um
memorial justificativo de para a construção de uma estrada de ferro de Iguape a
São Paulo. Esse projeto, no entanto, não teve andamento. Somente dez anos mais
tarde seria inaugurada a Estrada de Ferro Santos-Juquiá.
O
POLÍTICO
Eleito vereador com expressiva votação nas eleições de
30 de julho de 1895, tomou posse em 7 de janeiro de
1896, e nesse mesmo dia foi escolhido
pelos seus pares para ser o Intendente de Iguape (cargo
hoje equivalente a prefeito).
A Câmara eleita tinha o coronel Agostinho José Moreira
Rollo (Coronel Rollo) como presidente
e o tenente-coronel Zacharias Augusto Teixeira como vice-presidente, sendo os
demais vereadores figuras ilustres da época, como o capitão Júlio Fernandes de
Aquino, o vice-cônsul português Antônio Ferreira de Aguiar (que faleceu em 11
de fevereiro de 1896), o tenente José de Souza e Silva e o major Joaquim José
Rebello (Major Rebello). Foi reeleito nesse cargo nos dois anos
seguintes.
Em 30 de outubro de 1898, novas eleições são realizadas
(naquele tempo as eleições eram a cada três anos), sendo Young reeleito,
tomando posse em 7 de janeiro de 1899, quando outra vez foi escolhido para o
cargo de Intendente.
Permaneceu como governante de Iguape até o dia 3 de
janeiro de 1900, quando, devido a manobras políticas, foi substituído pelo
coronel Jeremias Júnior. Retornou ao cargo em 10 de setembro desse mesmo ano,
onde permaneceu até setembro de 1901.
Como administrador do município, realizou um governo austero
e equilibrado, no mais refinado estilo britânico, tendo se destacado por obras de
infraestrutura, saneamento e educacionais. Note-se que o cargo de Intendente
era o único remunerado, porém Young abriu mão do ordenado a que tinha direito,
o que representou para a Câmara, durante os quatro anos em que administrou o
município, uma economia de 4 contos de réis.
Recebeu a patente de major da antiga Guarda Nacional,
passando a ser conhecido como Major Young.
Maçon, fez parte da Loja Maçônica Iguapense, do Grande
Oriente do Brasil.
O
ROUBO DE SÃO MIGUEL
Um acontecimento inusitado ocorreu em 1897, envolvendo
o então padre de Iguape, José Moreau. Seu nome de batismo era Jean Moreau.
Chegando em Iguape, passou a se chamar José Moreau (ou José Moraes, para
alguns). Moreau foi vigário pelos idos de 1896/1897.
Por
volta da década de
Sendo
assim, resolveu ir até o Cemitério e, de revolver em punho, como se estivesse a
empunhar um turíbulo ou outro objeto santo, intimou, sem mais nem menos, ao
zelador do cemitério a lhe entregar a imagem de São Miguel. O assustado
zelador, sem esboçar qualquer reação, não teve outra alternativa a não ser
passar às mãos do padre o santo sob a sua guarda.
Evidentemente
que a notícia desse inusitado “sequestro” de São Miguel se espalhou como o
vento pela cidade, sempre pacata e sossegada. Sabendo do fato, o intendente de
Iguape, major Ernesto Guilherme Young não perdeu tempo e foi se encontrar com o
“raptor” no campo do Rosário e, no meio de várias testemunhas, intimou-o a
devolver o santo ao seu nicho, no cemitério, o que Moreau foi obrigado a fazer
por força das circunstâncias. O major Young requereu a vistoria, exame e auto
de corpo de delito na capela e na imagem.
Assim,
o desassossegado Moreau teve que amargar não ter conseguido o seu intento.
Pouco depois, os seus superiores eclesiásticos o “convidaram” a procurar outros
ares paroquianos.
AS
DIVISAS COM ITANHAÉM
Em princípio de 1896, a Câmara Municipal de Itanhaém
resolveu reclamar junto ao Governo do Estado e à Assembleia Legislativa a posse
do território compreendido desde a barra do rio Una até o canto do morro da
Jureia. A Edilidade itanhaense baseava a sua pretensão de posse num acordo
feito, em 1747, entre o padre de Itanhaém, Diogo Rodrigues de São José, e o de
Iguape, Antônio Ribeiro. Ocorre que esse acordo foi tão somente em nível
eclesiástico, não tendo sido oficializado pelas câmaras de ambas as vilas. Para
defender os interesses de Itanhaém foi encarregado o historiador e pintor
Benedito Calixto (1853-1927), e os de Iguape, o historiador Ernesto Guilherme
Young.
Assim comissionado, Young pesquisou os arquivos da
Paróquia de Iguape e dos cartórios locais. No Livro do Tombo, encontrou
registro feito pelo padre João Crisóstomo de Oliveira Salgado Bueno que, de
fato, os padres das duas vilas haviam feito o referido acordo; no entanto, o
governo da Capitania de São Paulo, em 22 de dezembro de 1817, ordenou ao
capitão-mor da Vila de Iguape, José Antônio Peniche, que reconhecesse aquele
território como distrito da Vila de Iguape, mandando, em 1818, ao Bispo de São
Paulo, D. Matheus de Abreu Pereira, que, eclesiasticamente, ficasse “por termo dividente a barra do rio Yuna”,
recobrando, assim, a vila e freguesia (paróquia) o seu antigo limite.
No despacho, enviado em 12 de dezembro de 1818, ao
padre João Crisóstomo, o Bispo de São Paulo determinou: “Fique por termo de divisão entre as freguesias de Iguape e Conceição
de Itanhaem o rio Yuna, e os moradores mencionados que se estabelecerem, sejam
fregueses de Iguape.”
No entanto, os interesses da Vila de Itanhaém não se
limitaram apenas ao trecho entre a barra do rio Una e o canto do morro da
Jureia: pretendiam também estender os seus limites no rumo sueste-noroeste até
atingir o rio Juquiá, tomando para si as freguesias de Juquiá e Prainha
(Miracatu). A Vila de Itanhaém não apresentou documentos históricos
comprobatórios de sua pretensão, mas alegou “que
a constante e antiga tradicção affirmava ser a divisa civil, a mesma que a
ecclesiastica, vindo a ser na marinha, desde o rio Mongaguá ao norte, até o cume
da Juréa ao sul [..]”. Ou seja, Itanhaém pretendia valer os seus pretensos
direitos baseando-se na tradição.
Após reunir documentação comprobatória suficiente,
Ernesto Young publicou o resultado de sua pesquisa no livreto “A questão de divisas de Iguape com a Villa
de Conceição de Itanhaem” (Typographia
Castro, 1906, Iguape). Os documentos pesquisados por Young foram decisivos
para que a Assembleia Legislativa confirmasse a posse de Iguape sobre a região
contestada.
O
HISTORIADOR
Foi como intelectual que Ernesto Young conquistou o seu
maior brilho. Interessado pela história local, realizou profundo levantamento
sobre as origens de Iguape, conseguindo publicar, em 1896, após anos de
pesquisa, na Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, do qual
será sócio, o seu clássico ensaio “Esboço
Histórico da Fundação da Cidade de Iguape”.
É' o mais completo trabalho histórico sobre as origens
da cidade publicado até hoje. Nesse estudo, Young, após exaustivas pesquisas
nos arquivos da Igreja de Iguape e nos cartórios locais, identificou o Bacharel
de Cananeia como sendo Cosme Fernandes, o que foi posteriormente avalizado por
renomados historiadores como Teodoro Sampaio e outros.
Em 20 de junho de 1895, Ernesto Young era admitido
como sócio do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, recentemente
fundado em 1º de novembro de 1894, e que viria a se tornar uma das mais
importantes instituições culturais do País.
Em reconhecimento aos serviços prestados ao IHGSP, no dia 20 de agosto de 1901, foi
aceito como sócio honorário dessa respeitável instituição. A esse respeito,
escreveu em 1908 o ilustre Dr. Edmundo Krug, sócio do IHGSP e presidente da
Sociedade Cientifica de São Paulo:
“Ernesto
Guilherme Young prestou tão relevantes serviços ao nosso Estado, que o
Instituto Histórico e Geográfico de S. Paulo achou-se na agradável contingência
de conferir-lhe o título de sócio honorário.”
O
JORNALISTA
Em 1899, juntamente com o major Abel Alves Fortes,
publicou o antológico “Almanach Iguapense”,
editado por Francisco Eduardo de Castro, que foi um marco da imprensa local,
onde, além de matérias variadas, incluiu seus trabalhos “Descrição da Zona do Rio Ribeira de Iguape” e “Uma Amostra da Nossa Entomologia”.
Também ao lado do inseparável companheiro de letras
major Abel Fortes, fundou, no dia 18 de fevereiro de 1900, o semanário “Comarca de Iguape”, um dos mais
importantes jornais da história da imprensa iguapense, que reunia a nata da
intelectualidade da época.
A “Comarca de
Iguape” era impresso pela Tipographia
Castro, situada no Largo da Matriz. Esse periódico veio substituir ao “Município de Iguape”, editado
anteriormente pela mesma tipografia.
O jornal contava com a colaboração de ilustres
iguapenses da época, como o coronel Agostinho José Moreira Rollo, o major
Ricardo Krone, o poeta José Emílio
Fortes (Jocelyn), o major Gentil
Moreno Fortes, o poeta Fernando Álvaro Rebello, entre muitos outros.
Era um “semanario
dedicado ao progresso da Comarca”. Depois passou a ter Antônio Marques
Teixeira do Amaral como secretário. Funcionou regularmente até fins de 1901.
O POETA
Poema escrito por Young, “I know who”, em 15/8/1881.
Em sua juventude, Ernesto Young escreveu, à mão, em um pequeno caderno
pautado, dezenas de poemas, e também algumas reflexões, sempre em inglês, seu
idioma materno. Conforme lembrou a poetisa Adelaide Petters Lessa, bisneta de
Young:
“Usava o verso como
professor de humanismo, ecologia e ética. Nasceu poeta. De cada poema retira-se
um ensinamento, cada um é educativo.” Os versos
descrevem “jogos de cricket, viagem de
vapor, as estações que ele percorreu no trem na Paulista, a história do
testamento cheirando a whisky strong, a luta do Lagarto com a Serpente e o
sintomático título In this wide world all alone”.
Vários de seus poemas foram dedicados à esposa Esther. Segundo Adelaide,
esses versos “deixam transparecer a
simplicidade, a ternura e a confiança com que eles se tratavam: ´I know who´,
´Kind lov I send you Esther dear´. Pode-se notar como ele percebia a saudade
que ela sentia de suas amizades na Inglaterra, bem como a festa que era para a
família o regresso dele ao lar após suas viagens de engenheiro-pesquisador,
coletor de mostras de madeira e de borboletas, ecólogo por amor à natureza do
Brasil”.
Continua Adelaide:
“São textos poéticos de
mais de um século, datados, assinados. Ele anotava o número de sílabas do
verso, o ritmo e as rimas desejadas. Sobreviveram cerca de 50 poemas, vários
sem título, outros inacabados, quem sabe legando á bisneta vindoura algum
fragmento de gene-para-a-poesia... Alguns são versiprosa, crônicas de fiel
observador da vida social e esportiva ao seu redor. Em caderninho de bolso ele
desenhava as curvas de rio, as altitudes do terreno, delimitando as fronteiras
de Iguape e dos vizinhos municípios. Talvez o mais raro dos intendentes, foi ele
o agrimensor, o prefeito-poeta.”
O APRENDIZADO AGRÍCOLA
No
mês de agosto de 1901, o Governo do Estado resolveu organizar um Campo de
Experiências em Iguape, num terreno doado pela Câmara, localizado ao pé do
Morro da Espia, a cua administração incumbiu o Dr. Lourenço Granato, inspetor
do 6º Distrito Agronômico.
Já
em 18 de março de 1903 o secretário da Agricultura aprovava as instruções
apresentados pelo Dr. Lourenço Granato para o funcionamento, anexo ao Campo de
Experiências, do Aprendizado Agrícola “Dr. Bernardino de Campos”, assim
denominado em homenagem ao ilustre paulista que foi presidente do Estado de São
Paulo em duas ocasiões, 1892-1896 e 1902-1904. Esse aprendizado foi o primeiro
criado no Estado de São Paulo, sendo o segundo em São Sebastião (SP), em 1905,
denominado “João Tibiriçá”, outro notório político paulista.
O
Aprendizado Agrícola tinha por finalidade: difundir os preceitos e as práticas
mais úteis à agricultura, por meio de lições teóricas elementares sobre as
diversas disciplinas que constituíam o seu programa de ensino e as
demonstrações essencialmente práticas a elas correspondentes, formando
cultivadores práticos aptos para dirigir os diversos trabalhos das propriedades
rurais.
Posteriormente,
o Dr. Lourenço Granato foi removido para Campinas, onde, já em 1907, era
diretor do conceituado Instituto Agronômico daquela cidade. Em seu lugar, foi nomeado
o major Ernesto Guilherme Young para diretor do Aprendizado Agrícola.
Em
1911, Ernesto Young, que também era presidente da Comissão Municipal de
Agricultura, enviou ao “Jornal do Brasil”,
do Rio de Janeiro (nº 270, de 26/9/1912), algumas informações sobre a produção
do arroz em Iguape:
“Em Iguape também foi menor do que a
anterior a safra de 1911. Prejudicaram-na as chuvas na occasião das queimas,
diminuindo a superfície plantada. As pragas do ´curuquerê´ e dos ´pulgões´
poucos damnos causaram. O arroz se exporta beneficiado para o Rio de Janeiro e
Santos. Os preços médios em 1911 foram de 3$000 [três mil réis] a
4$000 [quatro mil réis] por alqueire
de 40 litros em casca, na casa do lavrador. No município há 11 machinas
aperfeiçoadas, a vapor, para beneficiar e 10 movidas a água, [pelo] systema de pilões.”
O
Aprendizado Agrícola funcionou regularmente até o início de 1915, sendo então
desativado. O major Young ficou no cargo de diretor até a sua morte.
Nesse
local, em 1943, o Ministério da Agricultura criou em Iguape o Posto
Agropecuário, com o objetivo de prestar assistência aos agricultores iguapenses
e incrementar a produção de sementes. Esse posto, sob a direção do
engenheiro-agrônomo Dr. Heitor Cordeiro, funcionou ininterruptamente até 1960,
quando foi desativado.
OS
ESTUDOS SOBRE O ARROZ DE IGUAPE
Em
1898, o major Young publicou o opúsculo “A
Produção do Arroz em Iguape”, onde faz uma completa descrição desse cereal,
então chamado de “legítimo de Iguape”.
Segundo
Young, o arroz iguapense possuía casca de cor branca revestida por uma espécie
de pelugem áspera, que os lavradores chamavam de jussu. A semente era alongada, de cor branca-mate, adquirindo
brilho com a brunidura (beneficiamento). Um litro desse arroz em casca, na
média, pesava 615 gramas e continha 21.200 sementes. Já um litro do “arroz
maranhão”, que não era tão branco quanto o de Iguape, pesava menos (560 gramas),
enquanto um litro do “arroz carolina”, que mais se parecia com o de Iguape,
pesava 620 gramas e continha 21.000 sementes. De todas essas espécies, o mais
apreciado era o arroz de Iguape.
A
EXPOSIÇÃO MUNICIPAL
Em 1906, foi realizada a I Exposição Municipal
Agrícola, Zootécnica, Industrial e Artística, promovida pela Câmara de Iguape e
organizada pelo cientista Dr. Lourenço Granato, que era o inspetor de
Agricultura no Vale do Ribeira, além de ser o diretor do Aprendizado Agrícola “Dr.
Bernardino de Campos”, instalado em Iguape no ano de 1903.
Essa exposição, que durou de 28 de julho a 9 de
agosto, além de outros colaboradores, teve o major Young como diretor técnico
dos trabalhos, sendo realizada no Campo de Experiências, anexo ao Aprendizado
Agrícola, no Canto do Morro. Participaram dessa exposição o Dr. Carlos Botelho,
secretário da Agricultura, e o senador Cândido Rodrigues.
AS
DIVISAS COM CANANEIA
No início do século XX, existiam grandes controvérsias
quanto às divisas entre os municípios de Iguape e Cananeia. Acalorados debates
foram travados entre as câmaras das duas localidades, que reivindicavam os seus
direitos junto ao Governo do Estado. Comissionado pela Câmara de Iguape, o
major Ernesto Young organizou um mapa e reuniu documentos históricos para
comprovar os domínios iguapenses.
Em meados de 1907, entregou à Câmara o resultado de
suas pesquisas, intitulado “Memorial
Apresentado aos Illmos. e Exmos. Snrs. Presidente e Membros do Senado de S.
Paulo pela Câmara Municipal de Iguape Relativamente às Divisas entre os Municípios de Iguape e Cananéa”.
Finalmente, a causa foi ganha em favor de Iguape
(segundo o Parecer nº 190, publicado no jornal “Correio Paulistano” de 25-12-1907), coroando o trabalho de Young.
O
PRIMEIRO MUSEU
Afastado da política a partir de 1902, empenhou-se na
criação de um museu para a cidade, onde pudesse reunir documentos e objetos
relacionados ao passado de Iguape. Pela Lei nº 12, de 23 de dezembro de 1906,
foi criado o Museu Municipal de Iguape, por determinação da Câmara local, que
tinha como intendente o coronel Jeremias Júnior.
Para diretor do museu, foi nomeado o próprio Young,
ficando como zelador Manoel Antônio da Rocha. A inauguração deste que foi o
primeiro museu da cidade ocorreu no dia 5 de janeiro de 1907. Neste mesmo ano,
no mês de junho, Young editou o primeiro (e, provavelmente, o único) número da “Revista do Museu Municipal de Iguape”,
onde publicou completo levantamento da região, intitulado “Apontamentos para os estudos da Zona do Rio Ribeira e Município de
Iguape”.
Em sua edição nº 15.584, de 6 de janeiro de 1907, o “Correio Paulistano” publicou mensagem
do major Ernesto Young encaminhada ao presidente do Estado de São Paulo, Jorge
Tibiriçá, comunicando a criação do Museu de Iguape:
“Tenho a honra
de comunicar a v. exa. ter sido inaugurado hoje, nesta cidade, o museu
municipal creado pela Camara Municipal para activar a propaganda em prol deste
opulento município. Ao acto inaugural compareceram auctoridades locaes,
commerciantes, agricultores, reinando grande animação. Direcção do museu foi-me
confiada. Minhas Saudações. – Ernesto Young.”
Por ato do secretário da Agricultura do Estado de São
Paulo, em novembro de 1908, Ernesto Young foi nomeado presidente da Comissão
Municipal de Agricultura, com os membros Zacharias Augusto Teixeira e Alfredo
Fortes.
De 7 a 16 de setembro de 1910, era realizado em São
Paulo o II Congresso Brasileiro de Geografia, que tratou de assuntos relativos
à Geografia, Vulcanologia e Sismologia, Oceanografia, Meteorologia e
Climatologia, Magnetismo Terrestre, Antropologia, Etnografia, Explorações
Geográficas, Geografia Histórica, entre outras ciências. Ernesto Guilherme
Young participou desse congresso, ao lado de ilustres cientistas e intelectuais como Edmundo Krug, Manoel Pio
Correa, Ermelino Agostinho Leão, Afonso de Freitas, Antônio Ludgero de Souza e
Castro, Cornélio Schmidt, Domingos Jaguaribe, Eugênio de Andrada Egas,
Guilherme Wendel, Gentil de Assis Moura, Horace Lane, João Pedro Cardoso, João
Carlos Greenhalgh, Ricardo Krone, João Mendes de Almeida Júnior, entre muitos
outros.
Por ato do secretário da Agricultura do Estado de São
Paulo de 19 de janeiro de 1913, Ernesto Young foi nomeado presidente da
Comissão Municipal de Agricultura, com os membros capitão José Anastácio Fortes
e capitão Manoel Alves da Costa.
VIDA
PÚBLICA
Ernesto Young, com a esposa Esther.
O major Ernesto Guilherme Young teve uma vida pública
muito intensa. Engenheiro, pesquisou a geografia, hidrografia, fauna e fauna do
Vale do Ribeira, escrevendo trabalhos históricos e científicos e confeccionando
mapas precisos da região. Foi pesquisador e colecionador de entomologia (ramo
da zoologia que estuda os insetos), reunindo uma valiosa coleção.
Foi vereador e intendente de Iguape, cargos que
exerceu gratuitamente, com lisura e competência. Procurador da Irmandade de
Nossa Senhora das Neves. Procurador e depois provedor do Hospital Feliz
Lembrança (Santa Casa de Iguape); presidente do Club Recreativo e Recreativo
Iguapense, fundado em 8 de março de 1891; bibliotecário e presidente do
Gabinete de Leitura de Iguape, fundado em 31 de julho de 1847 e que funcionou
regularmente até o ano da morte de Young.
Foi um dedicado estudioso da Entomologia (ramo da
Zoologia que estuda os insetos), tendo formado uma rica coleção a respeito. Escreveu
o estudo “Uma amostra da nossa entomologia”,
publicado no “Almanack Iguapense para o
anno de 1899”.
ESTUDOS
HISTÓRICOS E CIENTÍFICOS
Ao longo de muitas décadas de estudos dedicados à
história, geografia, antropologia, entomologia e outras áreas científicas, o
major Ernesto Guilherme Young escreveu e publicou inúmeros trabalhos em livros,
revistas, jornais e periódicos.
No “Almanach Iguapense para o anno de 1899”, publicou:
– “Descrição da
Zona do Rio Ribeira de Iguape”.
– “Uma Amostra da Nossa Entomologia”.
Na “Revista do
Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo”, publicou:
– “Esboço Histórico da Fundação da Cidade de Iguape” – 1896, volume
II, págs 49-151.
–
“Subsídios para a História de Iguape - Mineração de Ouro” – 1900-1901, vol.VI, págs. 400-435;
–
“Subsídios para a História de Iguape - Seus Fundadores” – 1902, vol.
VII, págs 286-297;
–
“História de Iguape” – 1903, vol. VIII, págs 222-375;
–
“História de Iguape”(Documentos para
a) – 1904, vol. IX,
págs 108-326;
– “Apontamentos Genealógicos de Famílias Iguapenses” – 1905, vol. X, págs 3-28.
– “Apontamentos sobre Aleixo Garcia”
– 1907, vol. XII, págs. 217-228.
Pelo “Boletim da Agricultura” do Estado
de São Paulo publicou:
–
“O Arroz de Iguape” – Série 8, nº 9, págs. 421-425; nº 11, págs.
516-523; nº 12, págs. 583-588, São Paulo, 1907.
– “Calendário Agrícola para a zona sul paulista compreendendo os
municípios de Iguape, Cananéia e Xiririca” (in Boletim da Agricultura,
Série 10, nº 7, págs. 556-567, São Paulo, 1909).
Em “O Estado de
S. Paulo”, publicou:
“Subsídios
para a História de Iguape – Seus Fundadores” – Edição nº 8.638, de 23/7/1902.
Na “Revista do Museu Municipal de Iguape” (Typographia Brasil de Rothscild, São Paulo, 1907), publicou:
– “Apontamentos para os Estudos da
Zona do Rio Ribeira e Município de Iguape”.
– “Quadro Climatológico” (Anos
1895-1903).
Publicou ainda:
– “A Questão de Divisas de Iguape com
a Villa da Conceição de Itanhaem” – Typographia Castro, Iguape, 1896.
– “A Produção do Arroz em Iguape” – Iguape, 1898.
– “Mineração do Ouro - Subsídios para
a História de Iguape” – (Separata) – Typographia do Diario Official, São
Paulo, 1902.
– “A Igreja Matriz da Cidade de
Iguape” – Publicado na revista “Santa
Cruz”, do Liceu Coração de Jesus, nº 4, ano VI, 1906.
– “A Cultura do
Arroz no Município de Iguape” – Typographia Espindola, São Paulo, 1906.
– “Memorial Apresentado ao Illmos. e
Exmos. Snrs. Presidente e Membros do Senado de S. Paulo pela Câmara Municipal
de Iguape Relativamente ás Divisas Entre os Municípios de Iguape e Cananéa”
– Duprat & Comp., São Paulo, 1907.
A
MORTE
Young dirigiu o primeiro museu de Iguape e também o
Aprendizado Agrícola até o dia de seu falecimento, ocorrido em 26 de outubro de
1914, aos 64 anos. O Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo assim se
manifestou sobre a sua morte:
“Hoje não é
possível falar do desenvolvimento das ciências histórica e geológica no Brasil
sem a ele associar o nome do inolvidável consócio, que durante quarenta anos proficuamente
se entregou a sérias explorações científicas.”
Iguape e o Vale do Ribeira perdiam o seu grande estudioso
e defensor, que como nenhum outro soube investigar as origens, a história e a
geografia regionais.
Por ocasião de seu falecimento, o “Correio Paulistano”, nº 18.420, de 28/10/1914. então o mais
importante jornal publicado na Capital do Estado, escreveu:
“Major Ernesto Young – Seu Passamento – Falleceu nesta cidade o major Ernesto Young, director do campo de
experiência do Apprendizado Agricola ´Dr. Bernardino de Campos´. Era conhecido
naturalista e secretário da junta de alistamento militar. Contava 70 annos de
idade e era chefe de numerosa família, mantendo no nosso meio vastas relações. A
sua morte causou grande pesar. Deixa algumas producções sobre trabalhos
agrícolas. Entre os filhos, o finado deixa o sr. Ernesto Carlos Young e Eduardo
Alfredo Young. Era sogro dos srs. Antonio Zacharias Teixeira e Salvador
Moraes.”
Já o “Jornal do
Commercio”, do Rio de Janeiro, em seu número 30, de 29/10/1914, publicou
uma nota mais lacônica:
“Falleceu em
Iguape o major Ernesto Guilherme Young, Director do Aprendizado Agricola,
daquella cidade.”
Em 1917, durante o governo do prefeito capitão Augusto
Rollo, o nome do ilustre inglês que adotou o Brasil como a sua segunda pátria, foi
dado a uma rua na Beira do Valo, em Iguape.
ROBERTO FORTES, historiador e jornalista, é licenciado em Letras e sócio do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo. E-mail: robertofortes@uol.com.br
(Direitos Reservados. O
Autor autoriza a transcrição total ou parcial deste texto com a devida citação
dos créditos).