A beleza do mundo interior

Já nos primeiros horários da manhã participamos de muitos eventos que e por diversas vezes nem nos damos conta

Acordar, fazer as atividades de higiene, tomar o café da manhã (sozinho ou acompanhado) e sair para o trabalho pode parecer pouca coisa, mas se nos aproximarmos com uma espécie de ‘lente de aumento’ perceberemos que algo de muita criatividade já aconteceu sem o nosso controle (ao menos pelo controle da consciência).

Sim! Nesses poucos instantes do dia nossa imaginação e criatividade podem gerar cenas e cenários, aventuras e experiências dignas de realidade material.

Preocupações, desaforos e pensamentos que tentam organizar e planejar o dia, mas também desejos, encantos e possibilidades podem nos acompanhar. 

Criamos um mundo a parte, muito particular e real. Uma cena de um encontro desejado, uma conquista pessoal ou profissional são capazes de dar o tom nos devaneios. Medos, inquietações e aflições também estarão disponíveis no rol de possibilidades para a imaginação.

Isso acontece porque nossa atenção não é mais ‘treinada’ para percepção do nosso mundo interno.

Somos educados e treinados para estar sempre atentos e interessados, sem dispersão, nos objetos externos e experiências materiais. Toda criança já escutou de seus cuidadores frases como ‘presta atenção’, ‘tá no mundo da lua?’ ou ‘precisa se concentrar no que faz’. 

Esse modelo de educação da modernidade, em que privilegia a racionalidade como forma de ver o mundo, não é sem consequências, principalmente quando somos desviados da nossa interioridade. 

Escrevo ‘desviado’ porque um dia já fomos mais ligados no nosso interior do que hodiernamente. Lá na Idade Média e no mundo grego era natural se olhar para as experiências do mundo interior.

As ilusões nos cercam. Elas nos emolduram e em conjunto com as fantasias inconscientes são suficientes para nos levarem a lugares e aventuras inesperadas. 

Muitas vezes, se ficarmos presos a vivencias e suas histórias, corremos o risco de termos a sensação de que tudo é muito real, e nos desligamos (momentaneamente) da realidade.

Os pensamentos obsessivos são dessa ordem, mas não somente. Quem já passou por uma crise de pânico sabe dizer como os pensamentos do ‘medo de morrer’ a qualquer instante têm vida própria e como são verdadeiros. Eles vão aumentando e ganho formatações de uma vivência real.

As ilusões vão todas dando contorno à realidade. As ilusões caminham, todas elas para a realidade e nos ajudam a criar o que chamamos de ‘mundo real’ ou ‘realidade material’.

Somos feitos de uma materialidade corpórea, mas não nos resumimos a ela. Nossa vida psíquica desrespeita as leis da física e nos levam a altitudes que o corpo biológico nunca chegaria a alcançar.

Se recomeçarmos a ter mais disposição pelos nossos pensamentos, com certeza seríamos arrebatados pelos caminhos que podem nos levar. 

Seríamos capazes de perceber uma imensidão de vida que quase sempre passa distante do que fomos treinados a pensar. A vida infantil tem seus atrativos para o mundo interno. Uma criança está muito mais próxima do que sente e pensa, mesmo ainda não sabendo nomear.



Daniel Vicente da Silva

Psicanalista, Psicólogo especialista em Psicologia Clínico e Professor Universitário. Membro Associado do Núcleo de Estudos em Psicanálise de Sorocaba e Região – NEPS/R.

E-mail: danielvicente_@hotmail.com

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