Medo exagerado de lugares fechados

Essa semana tive uma experiência um pouco inusitada. Comum a alguns, difícil para outros, o exame de ressonância magnética, aquele que você pode ficar na dentro do tubo de imagens por ao menos 40 minutos.

Alguns fatores facilitam para que você não desenvolva medo, ansiedade ou “claustrofobia da ressonância”. 

A orientação do profissional de saúde que solicita o exame poderá auxiliar no momento. A troca com outras pessoas que já passaram pela experiência também pode facilitar na prática (nem sempre; às vezes a experiência é relatada com tanto pavor que as palavras colam em vocês).

Ainda, no dia do exame, toda orientação e acolhimento da técnica que auxilia na condução, respondendo suas perguntas ou relatando experiências anteriores exitosas podem criar um ambiente confortável.

Porém, não há garantias de que todas essas prévias orientações surtirão efeitos e terão garantias de que a pessoa conseguirá passar pelo mecanismo.

Certas pessoas realizam no tempo previsto, outras extrapolam por conta da sensação fóbica e constantemente aciona a campainha de emergência. Há pessoas que não conseguirão realizar o procedimento.

Fato é que há ‘ingredientes’ psíquicos que estão muito além do nosso controle. Normalmente, nos estabelecimentos em que se faz essa investigação é comum escutar das atendentes que “a claustrofobia por ressonância magnética é uma coisa que o paciente tem ou não tem”. 

Ao entrar no tubo você poderá apresentar sensações e pensamentos que podem atrapalhar seu comportamento durante o processo.

A frase das atendentes não está de todo errado. A questão é que responder o porquê alguém apresenta tais sintomas enquanto outras parecem ficar tranquilas é muito mais complexa do “ter ou não ter”.

Como somos seres de linguagem, não nos esqueçamos de que a palavra tem peso em nosso mundo mental.

Uma das justificativas para essa possível causa da sensação de angústia de estar preso em locais fechados é a ideia de que nossos antepassados passaram ‘poucas e boas’ em ambientes como cavernas e grutas, levando alguns deles à morte. 

A transmissão de tal memória seria a resposta do por que algumas pessoas são mais suscetíveis ao desenvolvimento da claustrofobia.

É uma história interessante, mas não me convence. Prefiro acreditar que a linguagem modularia nossos comportamentos a ponto de desenvolver sensações, pensamentos e estados emocionais sem o nosso controle. 

É como se, ao contar e narrar histórias de morte em cavernas e grutas, desenvolveríamos alguns tipos de intolerância a tais lugares (ambientes que irão passando a sensação de serem sufocantes, apertados). 

Logo, continuar descrevendo o pânico que é estar no tubo de imagens do exame de ressonância contribuiria para acreditarmos sem nunca ter estado lá. Outros fatores, como fantasias inconscientes, vivencias da infância e outras causas concorrentes também podem se fazer presente.

Ainda sobre o ‘peso da palavra no nosso mundo mental’, gostaria de esclarecer apresentando um estudo recente e muito interessante. Publicado na revista científica “Proceedings of the National Academy of Sciences”, ele sugere que nossos rostos humanos tendem a mudar ao longo do tempo para se adequar aos nomes atribuídos. 

Ou seja, por sermos seres de linguagem e criaturas sociais, somos afetas pela criação, a ponto de modular nossa face e associa-los a nossos nomes.

Enfiem, realizei o exame, descobri que não tenho claustrofobia, mas não sem desejar que aqueles minutos passassem um pouco mais rápidos.

Daniel Vicente da Silva

Psicanalista, Psicólogo especialista em Psicologia Clínica e Professor Universitário. Membro Associado do Núcleo de Estudos em Psicanálise de Sorocaba e Região – NEPS/R.

E-mail: danielvicente_@hotmail.com

Obs: A pesquisa citada foi comentada também no jornal ‘O Globo, 01/08/2024, caderno Saúde, p. 23’. Obs II: Ontem foi dia dos Pais. 

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